………………………………………………..Matéria de Perri Klass, do New York Times, publicada no UOL em 29/08/2018.

A mais famosa pintura de crianças brincando é “Jogos Infantis”, obra de 1560 de Pieter Bruegel, o Velho, mostrando a praça de uma cidade em que os pequenos, dos mais novinhos até os adolescentes (estudiosos contaram 246) estão brincando. Existem bonecas e bolas de gude, jogos com bola e de escalar (os estudiosos contaram cerca de 90). Só existem crianças na cidade, e suas atividades oferecem uma taxonomia da brincadeira.

Contudo, há quem se preocupe que nossa cultura atual seja menos amigável ao brincar e que as crianças talvez não explorem todas suas possibilidades. Para tentar abordar isso, a Academia Americana de Pediatria divulgou uma diretriz intitulada “O Poder do Brincar: O papel pediátrico para melhorar o desenvolvimento em crianças pequenas”.

O documento caracteriza a brincadeira como intrinsecamente motivado, envolvendo engajamento ativo e resultando em “descoberta feliz”. Ele sumariza extensa pesquisa desenvolvimental e neurológica sobre o tema e tenta trazer à tona algumas descobertas específicas no “achou” (jogos repetitivos oferecem “o prazer de ser capaz de prever o que acontecerá”) e “siga o mestre” (constrói o controle do impulso e função executiva). O texto também afirma que médicos deveriam estimular o aprendizado lúdico para pais e filhos, passando uma “receita de brincar” a toda consulta a uma criança sadia nos primeiros dois anos de vida.

É uma declaração de valores porque muitos que estudam o brincar se sentem sitiados, mesmo que novas pesquisas enfatizem sua importância no desenvolvimento.

“Estamos em um clima em que os pais sentem ter a necessidade de agendar atividades para todos os minutos do dia, e 30% dos jardins de infância não têm recreio”, afirma Michael Yogman, diretor do comitê de aspectos psicossociais da saúde familiar infantil da AAP e principal autor da declaração. Segundo ele, para alguns “brincar é considerado irrelevante e fora de moda”.

Benard Dreyer, diretor de Pediatria do Desenvolvimento e Comportamento da Faculdade de Medicina da Universidade de Nova York e ex-presidente da Academia Americana de Pediatria, afirma: “Costuma-se dizer que o trabalho da criança é brincar. É por meio da brincadeira que elas aprendem e se desenvolvem. É importante compreender como todos nós, e especialmente os pais, podem incentivar a brincadeira”.

“As crianças desenvolvem habilidades do século 21 brincando”, afirma Yogman, chefe da divisão do ambulatório pediátrico do Hospital Mount Auburn, em Cambridge, Massachusetts. Entre elas estão capacidades sociais, emocionais e a função executiva, “habilidades fundamentais para adultos na nova economia, que as ajuda a colaborar e inovar”.

De acordo com ele, uma função fundamental no atendimento pediátrico é fortalecer a relação entre pais e filhos, e brincar também é importante nessa área. Para Yogman, “quando um bebê de três meses sorri e o pai corresponde ao sorriso, essas atividades alternadas estão longe de ser triviais”, sendo importantes para desenvolver a linguagem e as habilidades emocionais e sociais, como o revezamento.

As relações estáveis com pais e outros cuidadores, construídas por meio dessas interações, também são importantes para ajudar as crianças a lidar com o estresse, o trauma e impedir o que passamos a chamar de “estresse tóxico” de prejudicar o desenvolvimento infantil.

A diretriz entra em detalhes sobre pesquisa recente demonstrando que o brincar pode afetar o desenvolvimento do cérebro em sua estrutura básica e funcional, com alterações que podem ser ligadas à brincadeira em níveis molecular e celular e em termos de comportamento e função executiva.

“Acredito que existe um papel pediátrico real em assinalar a importância profunda do brincar em muitos níveis. Os pais nos procuram para saber o que fazer com o filho, em quantas atividades matriculá-lo. Estou encantando que a academia esteja disposta a apoiar a ideia de receitar a brincadeira”, declara Yogman.

“Não se trata de brinquedos chiques . A questão são os artigos comuns de casa que as crianças podem descobrir e explorar”, como colocar colheres e recipientes plásticos no chão “e bater neles para ver o que a criança faz com aquilo”. Os pais costumam lhe dizer: “Nossa, eu sempre acreditei nisso. Que bom que foi validado”, acrescenta.

“O objetivo não é fazer os pais se sentirem culpados ou passar por cima deles como um especialista”, afirma Yogman, mas procurar momentos durante uma consulta para poder conversar sobre como a criança se desenvolve –um imperativo básico do atendimento pediátrico.

A diretriz defende um curso equilibrado em pré-escolas que não ignorem o aprendizado lúdico e que não considere o período gasto no canto de brinquedos como algo irrelevante, defende Yogman. Aprendizado lúdico significa apoiar a motivação para aprender e descobrir, intrínseca da criança pequena, em vez de impor motivações extrínsecas como provas valendo nota.

Para Dreyer, o que os pais precisam fazer é estar presente para ajudar os filhos como “estrutura”. Isto é, “não se deve controlar a brincadeira, mas se vir que elas estão prontas para a próxima fase, dê suporte”.

Passei boa parte do meu tempo em pediatria pensando sobre como podemos incentivar os pais a ler com os filhos como parte dos cuidados pediátricos. E, recentemente, escrevi sobre as iniciativas de “receitar” brincadeiras em parques.

Mas será que podemos “receitar” com êxito ler, brincar, sair de casa e as outras partes essenciais de uma infância saudável e movimentada?

Temas cruciais conectam todas essas ideias diferentes: a importância de interagir com as crianças, reagir a suas deixas e perguntas, o valor do contato face a face à moda antiga e a importância de ajudá-las a achar experiências que não tenham nada a ver com telas.

“Uma ‘receita de brincar’ que posso dar aos pais ao final da consulta é apenas dizer que não tem problema se valer do bom senso quando você acha que pode compartilhar parte da alegria da descoberta do mundo com seu filho. O objetivo é validar a conclusão a que os pais podem chegar por conta própria, mas se sentem pressionados por uma cultura que diz não, que as crianças precisam de um jogo especial em um iPad ou ou que precisam ter todos os minutos do dia programados”, diz Yogman.

Para acessar na íntegra:
https://vivabem.uol.com.br/noticias/redacao/2018/08/29/criancas-precisam-brincar-mais-interacao-e-essencial-para-desenvolvimento.htm?cmpid=copiaecola

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Tem interesse pelo tema? Conheça alguns livros da Summus que abordam o brincar e sua importância:

 

Este livro será lançado em breve

INFÂNCIA, LIBERDADE E ACOLHIMENTO
Experiências na educação infantil
Autoras: Tânia Campos Rezende e Vitória Regis Gabay de Sá 

Nos últimos anos, o tema da educação infantil ganhou destaque na mídia e na universidade. Cada vez mais se defende que a criança cresça num ambiente desafiador e, ao mesmo tempo, acolhedor e amoroso. Respaldadas por sua experiência de mais de 30 anos como educadoras, Tânia Rezende e Vitória Gabay de Sá apresentam neste livro a experiência vívida de uma escola baseada nesses princípios.

Em linguagem leve e acessível, as autoras conjugam teoria e prática utilizando uma ampla bibliografia, as leis nacionais mais atuais e relatos de casos.

Destinada a estudantes de Pedagogia, professores da educação infantil, pais e profissionais que lidam com a infância, a obra aborda temas fundamentais da área, como:

  • a medicalização indiscriminada das crianças pequenas;
  • a imposição cada vez maior de conteúdos em detrimento do tempo de brincadeira;
  • a dificuldade de lidar com alunos considerados difíceis;
  • os conflitos inerentes à relação entre pais e educadores;
  • os conceitos errôneos a respeito da inclusão de alunos com distúrbios físicos e/ou psíquicos.


VAMOS BRINCAR DE QUÊ?

Cuidado e educação no desenvolvimento infantil
Organizadores: Daniele Nunes Henrique SilvaFabrício Santos Dias de Abreu 
Autores: Silviane BarbatoMarina Teixeira Mendes de Souza CostaMaria Nazaré da CruzLavínia Lopes Salomão Magiolino Ivone Martins de OliveiraGabriela Sousa de Melo Mieto Fabrício Santos Dias de Abreu Daniele Nunes Henrique SilvaClícia Assumpção Martarello de ContiAnna Maria Lunardi Padilha

A obra foi estruturada com o objetivo de problematizar com docentes as ações do brincar que emergem no cotidiano escolar, e o seu papel essencial para o desenvolvimento da criança. A leitura organiza-se em um formato mais dinâmico, no qual, com base em uma proposta teórico-prática, busca-se fomentar nos professores um olhar mais sensível para a infância e suas produções. As análises tecidas pelos autores, tendo como eixo teórico a perspectiva histórico-cultural, buscam subsidiar a prática de professores no que tange às expressões infantis em que a imaginação e a criação estão, majoritariamente, presentes. Vale salientar que o livro traz sugestões de atividades que podem ser desenvolvidas na sala de aula. Prefácio de Ana Luiza Smolka, grande especialista em Vigotski.
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DANÇA E EDUCAÇÃO
30 experiências lúdicas com crianças
Autora: Fernanda de Souza Almeida

A criança tem outro campo de percepção, sua curiosidade, sensibilidade e capacidade de produção simbólica são expressas em gestos e movimentos. Portanto, a valorização do movimento, do brincar, das relações e das interações, oferecendo diversas possibilidades para expandir suas potencialidades, é fundamental.

Em Dança e educação, Fernanda de Souza Almeida apresenta 30 sequências didáticas completas que almejam a expansão da criatividade, da sensibilidade, da expressividade e do conhecimento de si, do outro e do meio. Sem reduzir o processo a passos, repetições, elaborações de coreografias para datas festivas ou mímicas de letras de música, a autora inspira o docente a criar novas perspectivas em direção a um processo educacional infantil de qualidade.

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